sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Único hospital municipal de Natal fecha portas e não admite pacientes

Saúde - Natal,RN

Hospital dos Pescadores, nas Rocas, enfreta problemas de infraestrutura.
Dos 32 leitos de internação, somente quatro estão em funcionamento.


O caos na Saúde Pública do Rio Grande do Norte vai além dos hospitais estaduais. Em Natal, o único hospital municipal deixou de admitir pacientes em situação de urgência ou emergência desde esta quarta-feira (12) e está transferindo ou dando alta aos pacientes internados. Além da falta de médicos, em decorrência da suspensão dos serviços dos profissionais ligados à Cooperativa Médica do Rio Grande do Norte (Coopmed), o hospital não oferece infraestrutura básica para atendimento. Faltam desde medicamentos básicos a equipamentos de ressuscitação de infartados, por exemplo.

A assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) confirmou que a titular da pasta, Maria do Perpétuo Socorro Nogueira, irá se reunir com representantes da categoria na noite desta quinta-feira (13) para tentar sanar o problema. A Coopmed realizará assembleia para decidir se retorna ou não ao trabalho também na noite desta quinta.
Além dos médicos cooperados, a Cooperativa dos Anestesiologistas do Rio Grande do Norte também decidiu paralisar as atividades nas unidades municipais de saúde. Eles cobram o pagamento de dívidas acumuladas no valor de R$ 3,4 milhões.

Na manhã desta quinta, a chefe do Setor de Fiscalização do Conselho Municipal de Saúde, Silvana Barros, visitou o Hospital dos Pescadores para constatar como o atendimento estava ocorrendo. "Recebemos uma denúncia de que estava faltando médicos e os pacientes estavam recebendo alta sem critério de avaliação", comentou. Entretanto, o diretor médico da unidade, Marcos Pinheiro, confirmou que os pacientes estavam recebendo alta ou sendo transferidos, mas somente após avaliação. "Estamos tendo todo cuidado antes de dar alta ou transferir qualquer paciente", ressaltou Pinheiro.

Apesar da afirmação do diretor médico, os familiares da aposentada Maria Galvão, de 83 anos, disseram que a senhora recebeu alta sem nenhum critério médico. "Ela sofreu uma queda e fraturou um osso na região da bacia. Ela passou 20 dias internada à espera de cirurgia que não foi feita. Hoje, o médico deu alta e mandou para casa onde deverá esperar pela cirurgia", afirmou José Lindemberg, filho de Maria Galvão. O diretor médico Marcos Pinheiro rebateu a informação alegando que a paciente havia sido avaliada e o melhor seria esperar em casa. Visto que, não há previsão para a marcação da cirurgia ortopédica eletiva.

Um outro paciente, em estado grave e precisando ser transferido para um hospital que realize um procedimento cirúrgico chamado gastrostomia, que consiste na abertura de um orifício no estômago para passagem de alimentos, aguarda definição da direção do Hospital dos Pescadores.
A paralisação dos profissionais ligados à Cooperativa Médica do Rio Grande do Norte, que reclamam do Município o pagamento de uma dívida estimada em R$ 6,4 milhões, refletiu ainda mais na superlotação das unidades estaduais de Saúde, cujo estado de calamidade pública foi decretado pela governadora Rosalba Ciarlini em 4 de julho passado.

A saúde pública de Natal vive um momento de extremos. Enquanto somente quatro dos 32 leitos disponíveis no Hospital dos Pescadores estão sendo utilizados, cerca de 100 pacientes superlotavam os corredores do Pronto-Socorro Clóvis Sarinho na manhã desta terça-feira (13). Uma das enfermarias do Hospital dos Pescadores foi interditada pela Vigilância Sanitária por não dispor de banheiros.

A sala de reanimação da unidade também foi desativada por falta de equipamentos indispensáveis à reanimação de pacientes, como o monitor cardíaco. Enquanto macas do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) ficam retidas nos corredores do Pronto-Socorro Clóvis Sarinho, outras ficam abandonadas num dos corredores do hospital municipal. A sala de reanimação da unidade estava sendo usada como Unidade de Terapia Intensiva (UTI) improvisada, enquanto deveria apenas estabilizar pacientes em estado grave.
"Como se vê, o problema não se resume à paralisação do atendimento médico. Vai muito além. É um problema estrutural. É um descaso com a saúde municipal", afirmou Silvana Barros. Em relação ao atendimento dos quatro pacientes ainda internados na unidade, a Coopmed reduziu a escala dos médicos plantonistas de três para um médico. "Não há escala para o pronto-socorro e somente os pacientes já internados estão sendo atendidos. Só há um médico para atender as intercorrências", confirmou Marcos Pinheiro.

O diretor médico lamentou a atual situação da saúde pública no estado e desabafou. "Os médicos acabam sendo os heróis e os vilões dessa história. A gente consegue, com o mínimo, fazer muito. Mas quando não conseguimos, por motivos diversos, não se reconhece que a culpa é da infraestrutura oferecida", destacou Marcos Pinheiro.

Desabastecimento generalizado
As unidades municipais de saúde enfrentam um desabastecimento generalizado. Enquanto a equipe de reportagem do G1 entrevistava os gestores do Hospital dos Pescadores, um dos diretores da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Pajuçara, na Zona Norte de Natal, entrou em contato com o Marcos Pinheiro para solicitar a transferência de cápsulas de dipirona. O médico relatou que os forcedores encareceram o preço do produto em 100% nos últimos dias como forma de 'aproveitamento' da situação caótica na Saúde.

No próprio Hospital dos Pescadores, a representante do Conselho Municipal de Saúde, Silvana Barros, confirmou que somente 30% de todos os pedidos encaminhados à Secretaria Municipal de Saúde eram atendidos.
Em recente fiscalização nos Centros de Apoio Psicossocial do Município, Silvana constatou a falta de insumos e medicamentos indispensáveis ao tratamento dos viciados em drogas e pessoas com distúrbios mentais. "Falta desde o antipsicótico mais simples aos medicamentos mais fortes", relatou Silvana.

Pronto-Socorro Infantil Sandra-Celeste irá fechar sábado (15)
A partir de sábado, dia 15 de setembro, o atendimento no Pronto-Socorro Infantil Sandra Celeste, única unidade municipal de Saúde voltada ao público infantil, será suspenso por falta de médicos.
Com mais da metade dos profissionais pediatras conveniados à Coopmed, as escalas de plantão não puderam ser fechadas pela direção da unidade.
"A escala de plantão precisou ser 'achatada' para garantir o atendimento. Entretanto, a partir de sábado, não terá mais atendimento na urgência, apenas nas consultas marcadas", confirmou o diretor da Sociedade de Pediatria do RN e servidor do Sandra Celeste, Nivaldo Sereno Júnior.
Dos quase 40 pediatras que atuam no Pronto-Socorro Infantil, somente os 14 servidores do Município estão cumprindo escala. "As crianças serão encaminhadas para os Hospitais Maria Alice Fernandes e Walfredo Gurgel, infelizmente. Nós estamos numa guerra sem solução nenhuma", lamentou Nivaldo Júnior.

A diretora da unidade, Telma Lúcia de Araújo, disse que o funcionamento do Pronto-Socorro está sendo feito de forma parcial graças aos 14 pediatras concursados. "Nós fizemos o possível e o impossível, mas chegamos ao limite. Eu não sei nem o que dizer", enfatizou Telma Lúcia.

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